Em Londres, um clube de swing reúne a elite europeia e segue princípios bem originais.
O principal deles: Quem dita as regras do que acontece nas festas são as mulheres.
No hall de entrada de uma mansão em Mayfair, região nobre de Londres, Emma Sayle recebia os convidados. Loira, com um vestido tomara que caia e saltos que a deixavam ainda maior do que os seus 1,83 m de altura, ela ia riscando os nomes na lista. Não fosse a moça fantasiada de policial, seria uma fila insuspeita — apenas mais uma festa para londrinos ricos. Antes mesmo que ela entrasse na casa, Emma tratou de apresentar um rapaz alto, forte e bonito. “Este é John. Ele tem uma partida de rugby amanhã à tarde. Melhor não deixá-lo muito bêbado.” Como uma boa anfitriã, em seguida ela pediu para guardar os casacos de seus dois convidados e, para que começassem a noite, ofereceu champanhe ao “casal”.
Emma, 31 anos, nasceu e foi criada na high society. Filha de diplomata, frequentou escolas caras, onde suas colegas eram meninas como Lady Gabriella Windsor, prima da rainha Elisabeth. Na adolescência, quando foi líder da The Sisterhood, uma organização esportiva formada só por garotas, uma de suas colegas era Kate Middleton, hoje namorada do Príncipe William. Com esse círculo de amizades, tudo levava a crer que Emma seria mais uma mulher da elite inglesa envolvida na organização de eventos como bailes beneficentes. Ninguém jamais poderia supor que hoje seu trabalho estaria tão longe disso. Em vez de eventos de caridade, seu dia a dia inclui a organização de orgias para os sócios do Killing Kittens, o clube de sexo criado e comandado por ela para reunir a “elite sexual do mundo”.
Regras Mulheres podem entrar desacompanhadas, mas os homens não
Exagero? Talvez. Mas o Killing Kittens realmente é um pouco mais do que um clube de swing dos bem-nascidos. A começar por seus princípios. O melhor deles: as mulheres ditam as regras — e as quebram, se quiserem. “Estamos acostumadas a ser tratadas como objetos nessas festas de sexo. E é assim porque esses eventos são organizados para os homens. Aqui não”, diz Emma. O próprio nome do clube já é um indício de que foi feito para as garotas. Reza a lenda que quando uma mulher se masturba, Deus mata um gatinho. Daí o nome Killing Kittens (“matando gatinhos”, na tradução do inglês). A ideia é que elas “matem” sem dó, em festas que acontecem uma vez por mês, sempre nas casas luxuosas dos seus sócios.
O público-alvo do clube são mulheres solteiras ou casais entre 18 e 45 anos. Eles são aceitos no clube após preencherem um detalhado questionário on-line, onde também postam uma foto. Nesse filtro, em geral um em cada três candidatos é recusado. Emma afirma que 70% de suas clientes estudaram nas melhores escolas de Londres e 30% vêm do restante do Reino Unido ou de outros países da Europa — a demanda já está levando a empresa para Edimburgo, Paris e Nova York. Ser bonito é um critério e ter dinheiro uma boa vantagem. “É verdade que meus clientes são ricos. Mas alguém menos abastado também pode ser aceito no clube se tiver um look legal e puder se dar a esse luxo”, diz ela. O luxo pode custar a partir de 300 libras por casal (cerca de R$ 750), valor cobrado pelo convite para cada evento, com direito a algumas bebidas. Ou pode-se pagar 600 libras (R$ 1.500) de anuidade e, nesse caso, ter acesso a convites pela metade do preço. Todos precisam estar bem- vestidos e, em princípio, mascarados. Os encontros são secretos, tanto que o endereço só é divulgado na véspera e câmeras e celulares são proibidos.
“Mulheres estão acostumadas a ser tratadas como objetos nas reuniões de sexo. Aqui não”
A proporção é de 60 garotas para 40 homens, o que torna inevitável o sexo entre mulheres. Para um homem entrar na “brincadeira”, ele precisa ter uma espécie de autorização, o que significa receber uma piscada de alguma mulher, por exemplo. Cinquenta por cento das pessoas que frequentam as festas, no entanto, não transam com ninguém. “Muitas garotas acabam vindo só para se divertir. Elas sabem que aqui podem dançar vestindo apenas lingerie e ninguém vai pular em cima delas.” Segundo Emma, as garotas se sentem poderosas. “Mas não é de um jeito agressivo. Elas são superfemininas”, afirma.
Negócio divertido
Antes de participar de uma das orgias do Killing, marquei um café com Emma. Estava curiosa para entender o que levou uma filhinha de papai a trabalhar na indústria do sexo. Quando nos encontramos, ela usava óculos escuros presos à cabeça e vestia uma blusa larga com legging e botas de cano alto. Embora estivesse superbronzeada — resultado dos feriados que passa em praias ou em estações de esqui —, não conseguia esconder um certo cansaço. Talvez por ter-se acostumado às críticas ao seu trabalho, parecia desconfiada. “Sou teimosa”, diz. “Quanto mais escuto ‘Você não pode fazer isso’, mais eu faço. Hoje minha família entende o meu trabalho, sabe que é um negócio.”
Ter escolhido a faculdade de Educação Física foi o primeiro sinal de que Emma não levaria uma vida tão convencional quanto a de seus colegas ricos que estudaram Direito ou Economia. Por um tempo, ela trabalhou como personal trainer no Caribe. Depois passou para marketing e vendas. “Só tem machista nessas áreas.” Quando se tornou freelancer na área de Relações Públicas, conheceu de perto a indústria do sexo. Entre seus clientes estavam festas fetichistas e swingues para o público A. “A indústria do sexo é dominada por homens. Eles administram tudo, desde as grifes de lingerie até as de brinquedos eróticos. Nada é feito pensando nas mulheres.”
“Imaginei criar uma sociedade secreta, um clima meio underground”
Depois de muito brigar por não concordar com o jeito como as tais festas eram organizadas, Emma decidiu fazer os rapazes provarem de seu próprio veneno. “Percebi que havia um espaço nesse mercado e, quase para irritá-los, passei a organizar meus próprios eventos.” Engana-se quem imagina que ela se inspirou na famosa festa do filme De olhos bem fechados, aquela em que Tom Cruise acaba indo parar depois de uma discussão com a mulher (Nicole Kidman). Para criar suas regras, Emma pensou em Clube da luta, estrelado por Brad Pitt e Edward Norton. “Eu queria uma sociedade secreta, um clima meio underground”, diz.
A primeira festa aconteceu em 2005 numa sauna na região de Covent Garden, em Londres. Hoje, o site do clube recebe 10 mil visitantes por mês. Seus sócios — 80% mulheres — aumentaram de 5 mil para 6.500 em dois anos. Mas quem são essas pessoas?
Para descobrir, coloquei um vestido preto coquetel e fui a um encontro do Killing Kittens que aconteceria na casa de Edward Davenport. Coincidência ou não, nos anos 80 ele era o organizador de festinhas pervertidas para alunos de escolas caras. Ter-se tornado sócio do Killing Kittens — e oferecer sua casa para as orgias do clube — é uma óbvia evolução das suas farras de adolescente.
Atmosfera sensual
Eu tinha lido num tabloide sensacionalista que as orgias de Emma eram frequentadas por gente do mercado financeiro, altos executivos, médicos e advogados. A verdade é que a maioria dos convidados evita falar sobre trabalho. Minha impressão é que eles tinham mais um ar de gente cosmopolita do que de aristocratas, como eu imaginava. A atmosfera era sensual, com os ambientes iluminados por luz de vela e lounge music tocando. Os homens vestiam um “esporte chique”, e a maioria das mulheres, vestido de festa. Poucos estavam de máscara. A maioria tinha por volta de 30 anos e era bonita. No começo da festa, algumas pessoas apenas conversavam sentadas sobre as camas armadas ao redor de um grande candelabro. Outras estavam perto do bar, onde serviam vodcas e coquetéis. Havia também os que estavam ansiosos para poder entrar nas hidromassagens. Puxei papo com a moça fantasiada de policial que encontrei na entrada. “É um público bem diferente para um swing”, diz ela. “Os lugares onde essas festas aconteciam eram horríveis e os homens muito agressivos, atirados, sabe? Fazendo essas festas luxuosas, Emma conseguiu atrair um outro tipo de gente. Os swingueiros hardcore não gostam dela por isso.”
Supostamente, a entrada de homens desacompanhados é proibida para garantir um clima descontraído para as mulheres. Um ou outro, no entanto, consegue passar pelo controle da recepção, mas depois fica meio deslocado. “Uma moça me mostrou a bolsa dela cheia de brinquedinhos eróticos”, me disse um deles, com uma cara de chocado. Nesse momento, uma sueca do tipo gostosa que passava por perto e ouviu nossa conversa confirmou a história. “Na última festa ela estava se divertindo com seus brinquedinhos naquela outra garota ali”, diz. “Elas gemiam para todos ouvirem. Foi muito engraçado.” De fato, a atmosfera é um mistura de bizarro e divertido. Para garantir uma certa ordem, há seguranças circulando. Eles mantêm um olho no comportamento dos homens e outro no consumo de drogas — quem for pego é expulso na hora.
“Essas festas são o máximo de fantasia que se pode trazer para a vida real”
Passado um tempo desde o começo da festa, o clima esquentou. Nas camas onde antes as pessoas conversavam, havia casais transando em todas as posições que se possa imaginar. Um deles fazia um ménage clássico, com duas mulheres e um homem. Um outro casal não teve a mesma sorte e ainda procurava uma garota para transar com eles. “Essa não, é muito baixa. Que tal aquela?”, eles conversavam. No corredor, mais casais, mais conversas engraçadas. “Nós precisamos voltar pra casa a tempo de acordar as crianças”, disse uma das mulheres. “Jura que você tem filhos? Seu corpo ainda está tão bonito!”, respondeu a outra. Enquanto essas cenas iam acontecendo em paralelo, algumas pessoas assistiam sem participar. “É o máximo de fantasia que se pode trazer para a vida real”, disse uma dessas “espectadoras”.
Elas escolhem os homens para transar. Muitas gostam de um ménage
Apesar de não entrar no swing, Emma Sayle diz que adora ver como as mulheres se sentem poderosas no Killing Kittens. “Elas não estão tentando ser como os homens. Simplesmente estão respeitando suas necessidades sexuais.” Suas clientes parecem satisfeitas. “Foi a melhor coisa que eu já fiz. Extravaso tudo aqui dentro e, lá fora, levo uma vida normal”, afirma uma delas. Sinal de que o jeito rentável que Emma achou para ganhar a vida está dando certo. Pode, no entanto, não ser por muito tempo. Mais uma de suas contradições, ela espera o homem certo para, se preciso for, largar tudo. “Se isso acontecesse, eu poderia virar dona de casa e ficar cuidando das crianças.”
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